Sentimentos Cotidianos

Alude

Conversávamos sobre como estou. Eu, eu mesma e a avalanche que chegou. Confesso a minha enorme surpresa ao sentir a minha própria frieza. Além, das insinuações questionadoras sobre algumas das minhas atitudes abaixo de zero. Faz tanto frio agora, que consigo sentir o sangue gélido em minhas veias se petrificar em direção ao meu coração. Eu não estou nas geleiras, as geleiras estão em mim. Ontem eu estava tão quente, mas com a mudança de clima fiquei fria. Congelei do mesmo jeito que a neve cai sobre as montanhas: gradativamente e repentinamente, de forma rápida e violenta. Foi assim, de uma hora pra outra, feito padecimento sem prenúncio.

Neve na grade. Foto: Laila Guedes

A mudança me define de tal forma, como uma obrigação de ir mudando todos os dias, todos os meses, constantemente a cada estação. Quem me ver igual talvez não saiba enxergar a minha inquietação que busca incessantemente por mudança. Além de inquieta, sou a própria mudança. Mas quem sabe olhar aqui pra dentro consegue ver a constância desta inquietação, que chega muitas vezes a ser gritante. Há em mim um alude de conflitos, de momentos penosos, de lágrimas solitárias, de embriagadas confidências. Há também momentos de ajustamentos e desajustamentos, de enganos e desenganos, momentos esses que são meus, somente meus, de mais ninguém. Não sei fingir não sentir, eu sinto, e devo sentir até além de avistar o desfiladeiro. Há períodos que essa avalanche vem com uma força tão devastadora, que fico enterrada na angustiante tempestade lúgubre. Daí a minha instabilidade de querer e não querer, de buscar sempre o que há de novo. Por ser o desconhecido tão febril ao ponto de derreter tudo que me soterra no tédio de se aferrar a mesmice dos hábitos.

Em certos momentos tenho a impressão que desapareço nesta selva esbranquiçada. E, na minha vasta dimensão silenciosa contemplo a fulguração de perceber o indizível de mim. Lugar este onde eu me rendo ao instante infinito da minha própria existência. Meu coração murmura docemente a falta do calor das emoções, aguardando o momento de descanso nos braços do céu e, um sopro venha tirar a neve do meu cabelo. Sinto cheiro de ventos fortes e o gosto acetinado das nuvens!

* Pra ficar ainda melhor escute a canção “My Immortal”.